Suporte
A invisibilidade de um grupo
Após dez meses da implementação do Plano de Atenção ao Imigrante, senegaleses continuam desassistidos pelo poder público
Jô Folha -
Como sobreviver com um salário baixo e ainda prover a família que mora longe? Essa é a situação do grupo de senegaleses em Pelotas. Eles vieram para cá em busca de oportunidades de trabalho. Dez meses após o lançamento do Plano de Atenção ao Imigrante, ainda não veem o apoio prometido se concretizar. Entre as ações propostas no projeto da prefeitura, um dos objetivos era realizar oficinas de empreendedorismo, algo que ainda não saiu do papel.
Com a finalidade de melhorar a renda para garantir condições de vida aos familiares no Senegal, país da África Ocidental que vive uma constante crise política, econômica e social, 50 senegaleses desembarcaram em Pelotas em 2015. Hoje restam em torno de 25, todos do sexo masculino, que tentam se sustentar por meio do comércio informal ou trabalhos da construção civil.
O Plano de Atenção ao Imigrante foi lançado em julho de 2016 para promover a inserção social desse grupo. Ele previa a criação de um Núcleo de Referência, assistencialismo com Cadastro Único, cartão SUS e acesso ao restaurante popular, assessoria jurídica e cursos de Português e Informática providenciados pela UCPel e pelo IFSul, além do incentivo ao artesanato e cursos de empreendedorismo.
De acordo com a chefe do Núcleo de Referência, Luana Quadros de Souza, um dos principais objetivos dessa unidade era a inserção dos senegaleses no mercado de trabalho formal. No entanto, apenas dois deles foram encaminhados pela Secretaria de Assistência Social (SAS) a essas vagas - eles trabalham na Litucera, empresa que faz o recolhimento do lixo.
Outra meta era disponibilizar espaço no Mercado das Pulgas para a venda de artesanato típico do Senegal, o que não teve a adesão dos imigrantes porque muitos não possuem interesse natural pela produção. A oferta de cursos de empreendedorismo para regularização do comércio também foi uma proposta, divulgada em agosto do ano passado, mas não foi realizada, segundo Luana. A fundação de uma associação para o grupo foi um dos últimos temas debatidos pelo Núcleo, que providenciou ajuda na documentação necessária. A efetivação da entidade, porém, ainda está em aberto.
Coordenadora do Grupo de Estudos em Política Migratória e Direitos Humanos (Gemigra) da UCPel, Ana Paula Dittgen considera que as medidas não deram conta de garantir uma alternativa de sustento, já que nunca entraram em prática. "Efetivamente não houve nenhuma mudança no comportamento da administração pública em relação aos senegaleses", afirma, apesar de manter a esperança de que a unidade tenha capacidade para promover intervenções concretas no auxílio a esses habitantes. Ela ainda conta que alguns até voltaram para o Senegal ou se mudaram para outras cidades, como São Paulo e Porto Alegre, em busca de melhores oportunidades. Sobre as aulas de Português e Informática, não ofertadas desde dezembro do ano passado, a coordenadora prevê que sejam retomadas nos próximos meses.
O secretário de Assistência Social, Eduardo Longaray, disse que a atividade do núcleo era, de fato, mais presente em 2016 e que em junho a pasta dará início a um trabalho de campo com os senegaleses, buscando conhecer as aptidões de cada um para depois direcioná-los ao mercado de trabalho.
Uma exceção à regra
Apesar de não serem os únicos praticando vendas ilegais, os senegaleses foram os que mais sofreram com a fiscalização da prefeitura. Após episódios de violência que ocorreram ano passado durante as vistorias, um deles escapou da irregularidade. Bathie Fall, de 26 anos, deixou o Senegal há dois anos e seis meses. Em Pelotas divide a moradia no Centro com um colega. Por conta própria, decidiu investir em um local fixo para vender sua mercadoria. A loja, batizada como Fall Acessórios, fica na rua Lobo da Costa, entre Osório e Andrade Neves. Inaugurada no dia 8 deste mês, disponibiliza acessórios, roupas e eletrônicos. Apesar da dificuldade e do encarecimento que acompanha a manutenção do local, Bathie espera ter sucesso no empreendimento e já planeja estratégias de marketing para estimular as vendas. "Como senegalês, é um orgulho", conta. Segundo ele, a grande maioria dos que trabalham na mesma área também tem o desejo de regularizar sua situação no comércio e viver sem problemas com as autoridades.
Lei da migração
Em abril o projeto que institui a nova Lei de Migração no país foi aprovado pelo Senado. Ele regula a entrada e a permanência do estrangeiro no Brasil e garante ao imigrante a condição de igualdade aos brasileiros com o direito à vida, à liberdade, à segurança, à propriedade e acesso aos serviços públicos de saúde e de educação, assim como acesso ao mercado de trabalho e à previdência social através do registro da documentação necessária. Além disso, institui uma política de combate à discriminação como a xenofobia e o racismo. A lei ainda aguarda sanção presidencial.
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